Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)

terça-feira, agosto 10, 2004

curta-metragem

acho que se começa por apagar as luzes do tecto e deixar que a imagem do écran ilumine toda a sala. acho que é assim que se faz. de alguma maneira, tenho sempre presente a dúvida de estar a fazer as coisas certas, ou a fazer as coisas da maneira certa. acho que é assim que se começa. depois, ouve-se um som. ou pode não se ouvir som nenhum. pode ficar só um silêncio que não se percebe muito bem de onde vem. pensamos: de onde vem o silêncio quando nos apetece falar. olho à minha volta, estou sozinho.

depois sim, as imagens. uma atrás das outras. existem paisagens e existem pessoas. primeiro paisagens, como se voássemos, planando feito pássaros por cima de campos ou cidades. lá em baixo, muito em pequenino, uma pessoa. aproximamo-nos, tão perto que parece que os vamos beijar. aproximamo-nos e sim, essa pessoa tem algo de familiar. no entanto, só se ouve o barulho das folhas das árvores a tocarem-se mutuamente. pensamos: de onde vem o barulho das árvores quando vemos uns olhos bonitos. olho à minha volta, há uma mensagem de telemóvel por enviar.

no escuro não podemos ver as horas nos relógios. temos um livro pousado sobre os joelhos e apetece-nos esticar as pernas. de um lado e de outro, pessoas mexem-se irritantemente, como nós estamos irritados. as pessoas falam. as pessoas vivem. aquele alguém que nos parecia familiar, afinal, é só alguém muito distante. num outro dia qualquer, vamos vê-lo outra vez, a fazer-se passar por alguém ainda mais diferente, mais longínquo. isso pouco importa. é assim que eu acho que as coisas são.

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