Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)

terça-feira, janeiro 06, 2004

sem gelo

desço a rua, que a esta hora é muito escura e está cheia de carros em cima do passeio, a pensar que não sou importante para o mundo coisa nenhuma, a pensar que mesmo que tivesse essa oportunidade eu iria dizer não, porque não me apetece, porque não quero ter que estar disponível, não quero estar acima de ninguém, o que agora me está mesmo a dar vontade de fazer é poder estar sossegado em casa, fechado no quarto, a ler, a ouvir música, a receber aqui e ali uma mensagem com uma palavra qualquer que me faça sorrir. sinto-me pequeno e é assim pequeno que me sinto bem.

não olho para a calçada porque sei, garantidamente, que ela continua por lá, exactamente no mesmo sítio.sinto-me despenteado e isso agrada-me. está um frio exagerado e fecho o casaco até ao queixo. penso que me sinto bem com este lugar, com estas ruas, com estes carros. penso que me faz bem falar, conversar, manter esta actividade de estar constantemente a inovar coisas cá por dentro. sinto que isso me garante alguma saúde mental ou, pelo menos, uma saúde mental minimamente exigível para nunca me sentir perdido. quanto muito, saberei o que me falta.

agrada-me a ideia de viajar, ainda mais para uma aldeia. agrada-me a ideia de passear por entre as árvores, ouvir o nada, saber que alguém caminha ao meu lado e que a conversa é agradável. é bom ouvir dizer que "é para isto que tenho amigos rapazes" e poder-te sugerir que um dia vamos ter sexo, mesmo sabendo que isso nunca irá acontecer. são coisas destas que me fazem pensar que há algures um mundo onde eu gosto mesmo de viver e que aí não é preciso nada ser importante ou fundamental. aí basta caminhar sabendo que a calçada está lá em baixo, no lugar de onde crescem os sonhos.

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