Arquivo do extinto blogue Esferovite- a vida em pedaços (13-08-2003/ 4-01-2006)

quinta-feira, outubro 09, 2003

"eu vim de longe, de muito longe..."

abri muito os olhos quando te vi em frente à  minha porta. não estava nada à espera que aparecesses. já há uns dias que não telefonavas, nem mensagens nem mails, nada. dantes ficava preocupado, mas agora já nem isso. já não me interessa. deixo que vás e venhas ao sabor dos teus estranhos desejos. eu fico aqui em casa, normalmente sentado na poltrona que era do meu avô, a perceber o sol a atravessar-me as janelas e a penetrar na minha sala como ponteiros de relógio. fico aqui em casa a ouvir aquela rádio velha que já vem desde sempre acompanhando os maluquinhos da famí­lia. tu, quando apareces, é sempre assim, sem avisar, procurando sempre a surpresa. eu abro muito os olhos quando te vejo.
já nem me lembro muito bem do dia em que te conheci, embora traga sempre tudo registado num velho caderno de capa dura que tenho na mala. não que eu escreva tudo o que acontece comigo. mas pelos menos registo algumas das impressões que vou tendo da vida. acho que deve haver alguma coisa sobre ti nesse caderno. aliás, tenho a certeza de que há. só não me lembro muito bem do dia em que nos conhecemos. talvez tenha sido um dia de sol, talvez tenha sido um dia de chuva. deveria fazer imenso vento lá fora. mas não foi na rua que nos conhecemos. acho que foi num quarto de hotel. não sei bem como me deu a vontade de bater naquela porta. mas sei que abri muito os olhos quando te vi.
agora que aqui estás fico na dúvida de te mandar entrar ou de sair contigo. não sei como seria ter-te aqui em casa. fico sempre nervoso quando estou à tua frente e não sou capaz de deixar de olhar os teus olhos. é-me estranho este arrebatamento. mas não, não estou apaixonado por ti. nem seria capaz de te propor fosse o que fosse. sinto-me tão mal na nossa intimidade inexistente. acho que o melhor é levar-te para uma esplanada, um sítio onde eu possa ficar a olhar-te através dos meus óculos escuros. pois foi. quando eu te conheci, estavas de óculos escuros. mas as luzes estavam apagadas. como eu te compreendo.

Sem comentários: